Ruelas profanas:
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Ruelas profanas –
Por estas Ruelas Profanas passam mulheres incomuns: são feiticeiras e vestais, valquírias e colombinas, musas, medusas e guerrilhei-ras. Contra o cenário hostil da cidade, onde o vento jamais cessa; debaixo do “tiroteio de estrelas” ou sob a lua inquisidora, “vibora de gesso”; esgueiram-se tais mulheres entre fuzis e perfumes, respondendo a secretas convocações.
A figuração do feminino parece oscilar entre os extremos da destruição e da doçura: de um lado, bailarinas de talco fugindo de caixas de música; do outro, sereias na proa dos naufrágios. Extremos que se encontram sob o denominador comum da transgressão e por trás dos quais, talvez, seja possível adivinhar as dores da vida comezinha, embaçada pela rotina, num prédio de escritórios onde secretárias de vaneiam rubricando a manhã.
Ainda que haja momentos de distensão – uma cerveja no céu no dia do Juízo, ou a festa ao fim do dilúvio universal – o que predomina é um clima de guerra que recruta os elementos naturais (fogo, chuva, relâmpagos), a paisagem urbana (com seus edifícios antropófagos e ofídicos metros) e o próprio corpo. Corpo frágil e potente, estojo de chagas, gritos, garras e, sobretudo, dentes – o que se pode verificar em passagens como “ela morde todos os chicotes” (“A Valquíria”), “o perigo das águas invencíveis que eu mordia, atada ao mastro” (“Visita da Sereia”), “mordo a capa ensandecida do bandido” (“Vísceras Noturnas”), “mastigo as asas de tua máscara” (“Musa”).
Aqui ou ali o leitor pode estranhar a adjetivação excessiva, o emprego abusivo de elementos exóticos com função ornamental: muito incenso, veludo, seda, cristal, marfins e lantejoulas. Mas são cismas que, na maioria dos casos, se esfumam diante do insólito de algumas imagens, ou da fluência alcançada por Piccolo num gênero relativamente pouco cultivado por escritores brasileiros – o poema em prosa – e que, por sua natureza híbrida, obriga o poeta a se empenhar no adensamento das imagens sem sacrifício da fluência discursiva que é característica da prosa.
Assim, vamos nos demorar nestas ruelas, vestir as máscaras, conhecer as mulheres que Rosana Piccolo nos apresenta neste livro de estréia. Que o consórcio com essas mulheres cresça a salvo de excomunhões ou fogueiras e nos devolva, como uma graça, a força de seus bruxedos.
Fábio Weintraub
Sobre a autora: Rosana Piccolo é nascida na cidade de São Paulo, em 26 de maio de 1955. Jornalista pela Fundação Cásper Líbero, atua na área de Publicidade há 13 anos. Bacharel em Filosofia pela Universidade de São Paulo (FFLCH-USP), onde iniciou, sem contudo concluir, mestrado sobre a obra de Friedrich Nietzsche, sob a orientação do prof. Dr. Gérard Lebrun.
Especificação: Ruelas profanas:
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