Medeias latinas:
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Medeias latinas –
Quem gosta, ou pensa que gosta, de mitos antigos pode ter neste livro a mais profunda alegria – ou a maior perturbação. Isso porque este belo trabalho organizado e traduzido por Márcio Gouvêa Júnior demonstra como a mitografia (em seu sentido estrito, a escrita de mitos) é um fluxo instável de variantes e contradições que convivem no repertório cultural de um mesmo povo, sem a fixidez que tantos esperam quando perguntam algo como Qual é a história de Medeia?, ou Quem é Medeia, afinal?. E talvez se descabelem quando não há uma resposta. Em outras palavras, a tragédia Medeia do grego Eurípides é apenas um ponto – talvez o mais famoso, neste caso, já que Píndaro apresenta uma versão anterior, hoje menos conhecida –, um ponto de partida para uma história que nunca termina sua reescrita, mas não é, nem será, seu ponto final, nem deve ocupar o espaço de verdade do mito, porque o mito é o que acontece durante sua enunciação, enquanto for capaz de produzir sentidos para um povo. Não é à toa, afinal, que Medeias permanecem tão fortes em nossa cultura – e muito além da recriação homônima de Pasolini, ou da Gota d’água, de Chico Buarque e Paulo Pontes. Medeia é, no fim das contas, nosso protótipo do feminino, da feitiçaria, do fratricídio, da paixão desmedida, do filicídio, do exílio, do grande outro civilizatório, da violência anárquica, etc. Medeia não se resume, se apresenta. E cabe aos leitores do presente revê-la para reapresentá-la. O que me leva ao que é, para mim, algo ainda mais importante neste livro. Márcio Gouvêa Júnior não é apenas um excelente compilador de mitos em sua versão romana – ele é um excelente tradutor, alguém capaz de devolver poesia àquilo que um dia foi poesia noutra língua, noutra cultura. E, convenhamos, isso importa, isso é o que importa; porque o leitor não vai se deparar com uma mera listagem enfadonha de variantes mitológicas. O que você tem em mãos, com estas Medeias latinas, é a chance de reexperimentar poeticamente as várias faces de Medeia dentro da cultura romana, de encarar o que há de variantes no seu conteúdo também pelas variantes da sua forma – o que só poderia ser feito por alguém que, além de erudito, é também um poeta. Guilherme Gontijo Flores Professor de Língua e Literatura Latina da Universidade Federal do Paraná (UFPR)
Especificação: Medeias latinas:
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