Fim da Terra:
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Fim da Terra –
“Fomos feitos de fagulha e dessa centelha de indigência”. Nenhum verso isolado daria conta da grandeza (tanto no sentido de sua qualidade literária como no sentido de sua discussão intelectual) de um livro como Fim da Terra, obra de maturidade de Rodrigo Petronio. No entanto, é irresistível iniciar esse curto depoimento sem alguma citação – no caso, do poema “Fomos feitos de mato e abandono e esqueciento”, um dos mais belos do livro –, tal a força encantatória das estrofes, construídas na convergência de pelo menos três vigorosos pilares: densas imagens inusitadas, cadência rítmica e rigoroso pensamento propositivo.
Melhores compreendidos dentro da tradição do que eu chamaria de Grande Poema (no sentido da produção universalista de poetas maiores como Pessoa, Paz ou Tagore), seja em poemas de fôlego ou em prosa, o poemário de Fim da Terra versa sobre a extinção do humano sobre este planeta; ou melhor, conta a história de uma combustão. Pois a história do humano sobre a Terra, desde que emergimos bípedes na savana pré-histórica, é a história de como temos queimado tudo, é a história de um fogo incessante, em carreira alucinada para o futuro. Esse fogo é transformado em luz e palavra pelo poeta, que também passará.
Como um ente onipresente, o poeta tudo vê e pressente, mas situa-se em sua época, encarnado em sua infância (“esparramava meu corpo pelo chão da sala. Horas de travessia lendo enciclopédias de astronomia e de antropologia”) e angústias atuais, enquanto lentamente um outro fogo (chamado tempo) também nos consome. Sonho.
Sol. Fogo lento. Terra Terra Terra. Gira. Fogo lento que digere. Sol. Ânus sobre a Terra. Buraco Negro. Caminhamos para a extinção? O Antropoceno…. Escreve o poeta em “Ressureição”: “O executado não morreu./O executado havia morrido antes da execução./O executado
fora executado no começo do mundo./O executado apenas esperou uma eternidade inteira para assistir à sua própria execução transmitida
via satélite./O executado nasceu executado.” Contribuição poética da mais alta relevância, Fim da Terra, a despeito de sua lúcida e por vezes quase científica abordagem, sua inegável luz iluminista, transpira uma profunda e pura religiosidade (são em complexas e intricadas ambiguidades que toda grande poesia viceja).
Tão profunda e pura é essa religiosidade (o volume inteiro poderia ser qualificado como um livro de orações) que dispensa a própria ideia da existência de Deus – uma ideia espúria. Rodrigo Petronio atualiza uma longa tradição de poesia filosófica e metafísica ao contemporâneo. Isso apenas já é um grande mérito.
Renato Rezende
Especificação: Fim da Terra:
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