E eu te matei bem aqui:
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E eu te matei bem aqui –
Uma mulher vaga pelo deserto. Ela não tem nome, nem origem, tampouco destino. Descobrimos que ela tinha asas a partir da afirmação de que foram cortadas: a única coisa que se agarra a seus pés calejados e garganta inflamada é o peso paradoxal da ausência.
A voz dessa mulher inunda os poemas e projeta em nós leitores a figura de um amor que, apesar de há muito perdido, continua latejando como um corte não cicatrizado. E, apesar de sermos alertados já no prólogo que “esse livro não é sobre você”, é impossível não delimitar neste vazio nariz, olhos e boca.
Zoë Naiman Rozenbaum escreve os buracos que o amor deixou pelo caminho. Se trata de uma poesia que, ao encher as páginas e descrever ricamente situações e lugares, acaba por evidenciar o espaço entre dois corpos que outrora foram uníssonos. Ela constata que há um grande abismo entre o que foi e o que poderia ser – os cacos estilhaçados entre presente e passado são um mosaico que nunca poderá ser completado. Por mais que vasculhemos bem, sempre vai faltar um pedaço.
Quando a falta é intensa, como não a materializar no próprio corpo? Alada como Eros, a mulher que ama demais se transforma no próprio amor e o manifesta tanto em criação – por exemplo, permeando a obra de uma linguagem metalinguística que tece o processo de escrita em paralelo ao luto – quanto em aniquilação: “eu destruí a obra / me destruí na obra / antes que tudo mais fosse destruído”. Ela chega à conclusão de que, para sobreviver, é preciso convidar Tânatos para ser andarilho no deserto. Aniquilar o outro é aniquilar a si mesma. “Aos poucos morria em você”, diz Zoë. E se eu te matei bem aqui, é porque eu precisava renascer.
Tóia Azevedo
Especificação: E eu te matei bem aqui:
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