Antologia poética: Eustáquio Gorgone de Oliveira (1974 – 2010)
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Antologia poética – Eustáquio Gorgone de Oliveira (1974 – 2010)
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A POÉTICA DE EUSTÁQUIO GORGONE DE OLIVEIRA
A poesia de Eustáquio Gorgone de Oliveira tem se desenvolvido, ao longo de vários livros, na retomada de uma linguagem fortemente impregnada de nosso passado colonial. O conservadorismo desta linguagem tradicional se vê submetido a um tratamento renovador, de tal forma que os clichês seculares se desmoronam pelas novas articulações e nexos sintáticos que se estabelecem. O núcleo desta poética é o interior de Minas Gerais, não apenas marcado pela presença de indicadores do cotidiano, mas sobretudo por uma forma peculiar de dizê-los. Assim, estabelece-se um paradoxo envolvente e viscoso: de um lado, a imobilidade de uma linguagem secular e o que ela pretende representar; de outro lado, o vórtice poético que suga e revolve a imobilidade, arrancando sentidos novos à força de formão. A matéria inerte pulsa de vida, se contrai e se distende, permanente e medularmente. O que mais atrai nesta poética talvez venha daí, desta sensação de estranhamento que parece entranhar o que é familiar. É a realização mais plena da ostraniênie já proclamada como virtude pelos formalistas russos.
Ao mesmo tempo solar e noturna, a poesia de Eustáquio Gorgone reflete clarões e sombras. A impressão – e a palavra não é usada por acaso – é de acompanhar um séquito imenso, procissão, talvez, em que círios e paramentos se movem e se agitam, trocando de lugar, contorcendo-se em espirais e volutas, ora grotescas, ora humildes, ora grandiloquentes e desesperadas. Misturam-se uma percepção fortemente concreta, materialista mesmo, e um misticismo visceral, entranhado, carregado de metáforas de vazio e de transcendência. Observe-se que grande parte do que foi afirmado até agora pode ser destacado dos títulos de alguns dos principais livros do autor, a saber, Girassol fixo, Passagem na orfandade, O vazio segundo o poeta, A janela do verbo assistir, Três verbos ajoelhados, A fortaleza de feno e O epílogo insepulto. Um girassol fixo, por exemplo, imagem que sintetiza as tensões inerentes à poética do autor mineiro, contém em si os elementos do paradoxo. Recusa o sol ou o aceita apenas enquanto estaticidade. Nega o movimento, embora o afirme pelo seu próprio nome. É esta a dicotomia que marca praticamente todos os poemas. E no entanto se move. Mesmo que captemos apenas a inércia aparente na superfície da linguagem.
Na paisagem poética de Eustáquio Gorgone, a escolha do vocabulário já nos conduz na direção do engano. As palavras estão cobertas de uma pátina de respeitabilidade vetusta. Isto eu conheço, pode afirmar o leitor satisfeito de si mesmo, deixando-se enganar. A transubstanciação poética, a alquimia do verbo, de que Rimbaud já falava, subverte as relações semânticas e faz com que o relicário se abra para se oferecer presente, atual, vivo. Se algo há, nesta perspectiva, é uma obsessiva e constante presentificação do passado. Os cadáveres ressurgem, e já não são os mesmos. A luminosidade que irradiam vem da linguagem que os instaura, agora, já.
Gilvan P. Ribeiro
Tribuna de Minas, novembro de 1995
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Eustáquio Gorgone cerziu com precisão, desde a sua estreia em 1979, um universo poético para o qual, até o momento, podemos evocar antecedentes, mas não sucessores. Para os conhecedores do percurso de Gorgone esta afirmação não soa exagerada, pois, apesar
da discrição do autor, sua obra se prospecta como um território indispensável, já que provoca as tradições literárias e culturais (sem prescindir delas), celebra a integridade da palavra (sem deixar de desconfiar de seus limites) e investe no diálogo entre as diferenças (sem abandonar-se a um relativismo estéril, que inviabiliza a tomada de posições em face dos conflitos).
Da Apresentação da Antologia poética de Eustáquio Gorgone
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Especificação: Antologia poética: Eustáquio Gorgone de Oliveira (1974 – 2010)
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